domingo, junho 15, 2008

Medo

Quem estudou História, quem sabe o que aconteceu por esses séculos fora, quem viu as imagens nos livros de tudo o que o ser humano foi e é capaz de fazer, quem sabe que há apenas 60 anos fábricas para matar pessoas estavam a funcionar no mais sofisticado dos continentes, quem leu sobre a guerra, as guerras, os ódios, as ideologias abstractas assassinas, as fomes e as pestilências, o desejo de impor uma supremacia religiosa cortando cabeças se necessário, quem aprendeu todo este desfile de horrores sabe que as últimas décadas na vida da Europa (a ausência da guerra entre democracias) são o maior milagre político da história da humanidade. Sabe que os tempos que vivemos são absolutamente excepcionais. Esta coisa de nos preocuparmos com a nossa vidinha somente, de os nossos maiores problemas serem o colega de trabalho que dá connosco em doidos, a aulas de Pilates a horários que não nos dão jeitinho nenhum ou que a pessoa X não teve a decência sequer de nos retribuir com um telefonema, isto é uma vida de sonho. Cada vez que desço à terra e me lembro que são estes os nossos problemas, dou graças a Deus. Estamos longe de imaginar o que será uma vida dura.

Mas quem sabe isto sabe também como é extremamente frágil e reversível toda esta doce existência. Pessoalmente, sinto medo, ME-DO, quando ouço falar de gasolina que não chega aos postos de abastecimento, de comida que não há nas prateleiras dos supermercados, de greves e lock-outs em vários países em simultâneo, de preços que sobem até não ser mais possível suportá-los, de inflações que deixam as famílias sem saber como pagar o tecto que as abriga, de recessões e estagnações económicas em efeito dominó, de um oceano imenso idosos que um dia não terão jovens suficientes que lhes paguem a velhice. De gente desvairada que não tarda começa a encher as ruas bradando contra a decadência, os deboches, os vícios e as ineficácias da Democracia. A mim, assusta-me terrivelmente a hipótese de perder esta liberdade fútil de que gozamos hoje.

Quem sabe o que foi a História, sente um ligeiro desconforto em estar-se marimbando para os problemas do mundo e querer é saber se o Cristiano Ronaldo vai ou não para o Real Madrid. Mais tarde ou mais cedo, o mundo vai acabar por bater-nos à porta.

1 comentário:

Eu sou assim! disse...

Concordo contigo em certa parte. A evolução dos tempos é mesmo isto: as preocupações de hoje não são as mesmas que eram há 300 anos atrás. Nem poderiam! Hoje vivem-se tempos fúteis. Em grande parte, sim. No entanto é preocupante a situação actual.

24 anos, velha carcaça.