sábado, setembro 30, 2006

Uma geração enganada













Em poucas áreas os equívocos foram maiores do que no ensino. Em Portugal, inquéritos à origem social dos estudantes e contas sobre o rendimento previsível dos licenciados levaram sistematicamente à ideia de que um diploma era um “privilégio”: para os bem-aventurados, era uma forma de se reproduzirem; para os outros, um meio de ascenderem. Era de facto assim. Mas a partir daí imaginou-se que a questão era expandir esse “privilégio” administrativamente, de maneira mais barata e expedita. A facilidade passou a ser encarada como um princípio de justiça social. A mínima referência à qualidade levava a suspeitas de “elitismo”.

Gerações sucessivas atravessaram um sistema de ensino calafetado em geral contra qualquer forma de avaliação externa, onde a aquisição de competências e conhecimentos foi frequentemente secundária em relação a objectivos de suposta inclusão social. Durante anos, enquanto o Estado, sempre em expansão, absorveu metade dos licenciados, tudo correu mais ou menos bem, por entre discussões inconclusivas acerca das “reformas estruturais”.

Foi assim quase até ao verão de 2005. Então, subitamente, o mundo mudou. Agora, talvez demasiados jovens estejam condenados a descobrir que passaram pelo equivalente escolar das fábricas de têxteis e de calçado mais obsoletas. Pedem-lhes agora para competir num “mercado global”. Hão-de perceber, da pior maneira, que o sistema de ensino não os habilitou verdadeiramente para nada que não fosse o mundo que acabou. Que vão fazer? Ou antes: que podem fazer?

Houve em Portugal gerações que gozaram a festa. Haverá um dia gerações que já não vão esperar festa nenhuma. Mas há, neste momento, gerações que foram convidadas para uma festa que acabou antes de eles chegarem. Histórias destas nunca terminam bem
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Rui Ramos (Público 28 SET 2006)

domingo, setembro 24, 2006

The miseducation of JFFR

A outra noite, passei os olhos pela nova telenovela da SIC, “Jura”. Deu logo para perceber o que vinha por ali. Sexo ousado (muito bom para “abrir mentalidades”, dizem), traições e infidelidades a rodos, casais que se trocam num swing não oficializado, casamentos falhados (essa inevitabilidade dos tempos modernos).

No dia seguinte, vi na rua um enorme cartaz promocional da nova novela, que anunciava: “O filme das nossas vidas”.

Em toda a minha ingenuidade, formulei, incrédula, esta questão para mim mesma: Meu Deus, é isto a vida?

sábado, setembro 23, 2006

Shaná Tová


No calendário judaico, marca-se hoje o início de 5767. Celebra-se Rosh Hashaná, o começo de um novo ano. Em simultâneo, comemora-se o aniversário da criação do Homem. Conta-se que desde aí, cinco judeus mudaram o curso da História.

Houve Moisés, que disse: "TUDO é a lei".
Veio Jesus, que anunciou: "TUDO é amor".
Surgiu Marx, que afirmou: "TUDO é capital".
Freud apareceu então, para chocar: "TUDO é sexo".
Einstein, por fim: "Tudo é RELATIVO".

Balanço provisório

À segunda ronda do combate entre semanários (EXPRESSO e SOL), continuo fiel ao EXPRESSO. Os temas de fundo são mais relevantes do que os até agora adiantados pelo SOL - as ilicitudes de Isaltino (assunto já muito batido) e as relações de amizade de Proença de Carvalho com pessoas importantes do PS não trazem, sinceramente, nada de novo. E, sobretudo, o EXPRESSO tem mais e melhor opinião.

Curiosa foi a entrevista do director do SOL, José António Saraiva, à Judite de Sousa, em que dizia que o novo semanário ia ser muito apelativo junto do sector feminimo e que também por isso o SOL seria um projecto inovador. Porquê?, perguntou Judite. Responde JAS: "Sei lá, tem uma coluna sobre sexo da Margarida Pinto Rebelo e uma secção de jardinagem, por exemplo".

Futurologia: o FC Porto será campeão nacional



Quatro jogos, quatro vitórias, primeiro lugar na classificação, o melhor ataque e a melhor defesa.

segunda-feira, setembro 18, 2006

CARTA ABERTA AO MUNDO ISLÂMICO

Querido Mundo Islâmico,

Parece que andas irritado connosco e que exiges um pedido formal de desculpas do Papa. Andámos outra vez a falar do vosso Profeta e, como civilização decadente que somos, parece que nunca queremos saber da vossa hipersensibilidade. Shame on us.
Mas caro Mundo Islâmico, se me permites, eu já há muito que espero um pedido de desculpas da tua parte e esse dia nunca chegou. Por isso, querido Mundo Islâmico, de civilização para civilização, já que vamos entrar numa de diplomacia, gostava que tu me pedisses desculpa pelos seguintes acontecimentos:

- por o Bin Laden e os seus amigos terem dito que pretendiam recuperar o Al-Andaluz para o Islão. É irritante, sobretudo para quem vive aqui na Ibéria...

- por os Talibãs terem destruído à bomba uma das grandes obras de arte da humanidade, os Budas de Bamyan. Foi extremamente desagradável...

- por cada vez que vocês são acusados de violentos, vocês sairem às ruas para protestar com... mais violência. É confuso, sobretudo para as nossas esquerdas, sempre a dizerem que vocês no fundo são bons rapazes...

- pelo assassinato de Theo Van Gogh. Que diabo, um homem já não pode fazer um filme...

- por o Presidente do Irão já ter dito mais que uma vez que o Holocausto nunca existiu e que Israel deve ser apagado do mapa. Que querem, fico também eu hispersensível nessas alturas...

- por enforcarem homossexuais na praça pública. Estou a chatear-vos em demasia com esta coisa insólita dos direitos humanos?

- por os Talibãs terem, durante 7 anos, obrigado as mulheres a saírem à rua embrulhadas como se fossem uma mercadoria. É só que é inestético, choca-me...

- por em Londres terem sido exibidos cartazes que diziam “Freedom Go To Hell”, “Behead Those Who Ofend Muhammed” e “ Islam Will Rule the World”. Sinto-me ofendida...

- pela sentença de morte lançada sobre o Salman Rushdie. É simplesmente ultrajante...

- por acharem que os Judeus devem ser todos atirados ao mar e não terem qualquer pudor em declará-lo. Podias, querido Mundo Islâmico, pelo menos ser um bocadinho mais polido?

- por me chamarem cruzada, infiel, decadente, a toda a hora. É chato...

- por um desenho do vosso Profeta ter dado direito a Embaixadas destruídas, bandeiras queimadas, gritos de guerra e declarações de ódio. Se vocês andam de mal com a vida, não descarreguem as vossas frustrações em nós...

- pela decapitação de Daniel Pearl e todos os outros jornalistas . Ainda hoje espero um pedido de desculpas...

- por os vossos mais encarniçados líderes se terem associado aos comunistas e neonazis do lado de cá. Havia necessidade de reavivarmos velhos fantasmas? Havia?

- por terem saído à rua para festejar a queda das Twin Towers. Em duas palavras: mau gosto...

- por terem trazido a poligamia para o centro da Europa. É indecente...

- e, last but not least (muito ficou por enumerar), por Nova Iorque, Bali, Casablanca, Madrid, Cairo, Istambul, Jacarta, Amã, Beslan, Londres, Bombaim - e Israel desde sempre.


Exijo um pedido de desculpas. Já.

Atenciosamente,
JFFR

quinta-feira, setembro 14, 2006

Não percebo

Ao cabo de meses, ainda não consegui decifrar o cabelo do Frederico Fritzenwalden. Uma primeira vista sugere-me cor de ferrugem. É um laranja acastanhado ou um castanho alaranjado, não sei; quiseram dar-lhe um ar nórdico, mas pô-lo completamente louro talvez não fosse credível... A solução foi isto. O que eu sei é que aquilo não é cor de cabelo e mete dó. E quem não sabe fica a saber que o príncipe encantado em questão é filho do Diogo Freitas do Amaral.

segunda-feira, setembro 11, 2006

domingo, setembro 10, 2006

Sobre Ele, II

O medo não se extingue, jamais (pensavam? Enganaram-se). Poderá adormecer, mas renasce a dobrar. Em que se traduz afinal esta coisa tenebrosa? Na certeza de que o que separa a felicidade da miséria é uma linha tão, tão ténue. Um extracto de poeira. Traduz-se na constatação lúcida de que o destino, apesar de ser destino, por vezes não se cumpre, e que sou impotente para travar essa lei da natureza.
Traduz-se no maior paradoxo de todos: a angústia de querer saber o futuro quando desconhecê-lo é a mais desejável forma de ignorância. O medo é a dor por antecipação.

Mas não é altura para pensar nisto.
Amanhã é dia 11 de Setembro.

sexta-feira, setembro 08, 2006

Notícias frescas do fabuloso universo do Islão

Pensava eu que já tinha visto o suficiente para ficar impressionada, mas qual quê. A polícia saudita deve andar com pouca coisa para fazer e viu-se obrigada a ser criativa para não morrer de tédio. Agora, na Arábia Saudita, tornou-se proibida a venda de cães e gatos, porque se trata de uma má influência Ocidental (...esta parte era dispensável, vocês já tinham adivinhado). O próximo passo será certamente considerá-los bichos infiéis ao Profeta e passíveis de levar com uma fatwa em cima.

Lindos países, estes.




Os camelos ainda são permitidos

quarta-feira, setembro 06, 2006

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De vez em quando, acontecem coisas que deitam logo por terra longos períodos de engenharia mental, durante os quais procuro reunir razões que me convençam de que sim senhor, existe um significado qualquer por detrás de tudo isto; sim, há um sentido oculto, mas belo necessariamente; não, o mundo não é uma tragédia - o bem normalmente acaba por prevalecer sobre o mal; não andamos todos por aqui à toa. E não consigo provar que Ele não existe, o que, por incrível que pareça, é suficiente para me ir contentando.

Ontem à hora do jantar, para além de ficar sem vontade de comer, veio ao de cima toda a veia nihilista que há em mim.
Uma investigadora portuguesa foi assassinada. Vejamos os pormenores: uma mulher cheia de boa vontade (queria contribuir para um mundo melhor, dizia ela) foi até ao lugar mais remoto do mundo - os confins da floresta amazónica - para concluir a tese de doutoramento, e encontrava-se a tomar banho numa zona isolada; por ali andava um ex-presidiário regenerado (mulher e filhos) que, por ter andado a beber, se encontrava desvairado. Resultado: ela é violada, espancada, asfixiada, arrastada e deixada a apodrecer num ermo.

Esqueçam todas as boas intenções. Não há sentido num mundo em que estas duas criaturas se cruzam no local mais inóspito da terra e o mau destrói o bom desta maneira. Por absolutamente Nada.

domingo, setembro 03, 2006

sábado, setembro 02, 2006

Ronron




A criatura que maior inspiração exigiu à Providência Divina foi sem dúvida o gato.

24 anos, velha carcaça.